quinta-feira, 20 de março de 2014

Sobre a “menor taxa de desemprego da história”


(Escrito em 30 de janeiro de 2014)




O IBGE divulgou, em 30 de janeiro de 2014, a taxa desemprego de dezembro de 2013 e, portanto, a taxa média do mesmo ano.

 As manchetes foram:

- “Desemprego cai para 5,4% em 2013, o menor da história” (site da Veja);

 - “Desemprego fica em 5,4% em 2013, o menor da história” (site G1 – o portal de notícias da Globo);

- “Taxa de desemprego cai para 5,4% em 2013, a menor da história” (site do Estado de S. Paulo);

- “Desemprego recua para o menor nível da série histórica e fecha 2013 em 5,4%” (site de O Globo);

- “Desemprego em 2013 foi de 5,4%, menor nível desde 2002, segundo IBGE” (UOL Economia).

 
A melhor, quer dizer, que melhor informa ao leitor, é a última, do UOL. Em segundo lugar, a do Globo. As outras me deixaram muito incomodado ao falar em “menor da história”.


Em 2002 houve mudança tão significativa na metodologia da Pesquisa Mensal de Emprego - PME, que o IBGE interrompeu a série antiga e passou a publicar a série nova sem encadear com a antiga, como costuma fazer com outros indicadores que sofrem mudança metodológica. Isso fez com que a análise da taxa de desemprego perdesse perspectiva, já que os analistas e jornalistas passaram a olhar para a série só a partir de 2002. O gráfico a seguir mostra também a série antiga da PME e a taxa de desemprego calculada com base na Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios – PNAD, também do IBGE. Como a PNAD é anual, mostro a série da PME também anual.

Os movimentos que podem ser claramente observados são de uma queda forte por ocasião do Plano Cruzado (1986), queda que sobreviveu ao fracasso do mesmo no combate à inflação, até ser revertida na época da recessão provocada pelo confisco do Plano Collor. Os dois primeiros anos do Plano Real, 1994 e 1995, produziram queda na taxa de desemprego, que já se iniciara em 1993, ano de preparação do plano, mas as crises dos países emergentes que se seguiram a fizeram subir novamente. Na década de 2000 começa o movimento de queda, que se estende até o presente e se mostra mais agudo na PME do que na PNAD.

 

 

Taxa de desemprego (%) por três metodologias do IBGE
 
 
 
Fonte: IBGE e IPEA
 
O próximo gráfico mostra a taxa de desemprego na região metropolitana de São Paulo, segundo a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados – SEADE, do Estado de SP. Pus em outro gráfico porque seus números são mais altos e essa série “achataria” as demais. Os números são maiores porque a metodologia é diferente. Mas o importante é ser uma série só em todo o período, de 1985 a 2013[1]. Neste caso, podemos ver, claramente, que a taxa de desemprego na época do Plano Cruzado, em 1986, e até 1989, foi mais baixa do que a atual.

Mas, em se tratando de estatísticas econômicas, não convém fazer um campeonato muito exato de números. O que os gráficos deixam claro é que falar de “menor da história” está errado. O certo é falar menor da série atualmente calculada pelo IBGE, desde 2002. Infelizmente, não consegui dados anteriores a 1980, o que nos deixa com um período muito curto para falar em “história”, o que dizer de 2002. A taxa de desemprego está baixa, mas esse tom épico, histórico, não ajuda a enxergar problemas que o próprio mercado de trabalho já começa a apresentar. Além disso, esses números favoráveis do mercado de trabalho podem ter a ver com fenômenos da demografia, e dificilmente com políticas governamentais; afinal, que políticas do governo estariam gerando a redução da taxa de desemprego? E o mercado de trabalho não poderia estar tão bom graças ao crescimento econômico, que há anos é baixo. Na verdade, tem uma leitura bem negativa disso: se o PIB cresce só a 2% há uns três anos e o desemprego está baixo, isso pode significar que 2% é o máximo que o Brasil consegue crescer no curto e médio prazos, o chamado crescimento potencial. E a inflação alta, combinada com crescimento pequeno do PIB e taxa de desemprego baixa, corrobora essa visão.
 






 




[1] O último dado disponível para 2013 é o de outubro; o número mostrado no gráfico para a média de 2013, 10,5%, é a média do período de nov/2012 a out/2013.