sexta-feira, 16 de junho de 2017

Bate-papo com estudantes sobre o filme "Real - o plano por trás da história"

Na quinta-feira, 08/6, participei de mais uma mesa-redonda sobre o filme “Real – o plano por trás da história”, após a exibição para alunos de graduação na FGV/RJ, iniciativa do D.A. do curso de Administração. Da equipe do filme, estavam o produtor, Ricardo Fadel Rihan e o roteirista, Mikael de Albuquerque (na foto, conversando com os estudantes, Rodrigo, Mikael e eu, da esquerda para a direita). Meu papel foi falar sobre a economia do Plano Real – o filme não é um documentário, nem uma aula sobre o Plano Real, de maneira que muitas dúvidas ficam no ar. É um “thriller” que tem foco na equipe econômica que fez o plano, tendo como protagonista Gustavo Franco. O filme quer, além de entreter, destacar esse momento importante da vida nacional e despertar o interesse, especialmente nos mais jovens, motivando-os a se informarem sobre o Plano Real.
Sobre a economia do plano, destaquei algo importante a ser entendido, que é a diferença de natureza entre inflação e hiperinflação. A inflação é a subida permanente do nível geral de preços. Isto é, apesar de alguns preços caírem e outros subirem, na média a tendência é de alta. Isso ocorre nas economias em geral, uma característica dos séculos XX e XXI, em que têm sido raros os episódios de deflação, isto é, a queda continuada do nível geral de preços. A inflação pode ser alta ou baixa: sendo alta, é um problema; sendo baixa, não. Mas, a partir de certo nível, num ambiente de inflação altíssima, que recebe o nome de hiperinflação, a característica principal do fenômeno deixa de ser a elevação dos preços e passa a ser a substituição da moeda (isto é do dinheiro): a hiperinflação é um processo de substituição da moeda. Algo que é usado como moeda deve ter três funções: meio de troca, reserva de valor e unidade de conta. Quando a moeda, por causa da inflação, deixa de cumprir essas funções, ela precisa ser substituída por outra. Essa substituição vai se dando pelas próprias ações das pessoas, pois uma economia não pode funcionar sem moeda – a vida não é possível sem as trocas e as trocas não são possíveis sem dinheiro. A moeda substituta varia conforme a época e localização, mas, na América Latina do Século XX, a moeda substituta de preferência era o dólar americano; por isso, uma consequência das hiperinflações aqui ocorridas foi a dolarização das economias. No Brasil, nas décadas de 1980 e 1990, antes do Real, já havia alguma dolarização. Por exemplo, os preços de imóveis eram anunciados nos jornais em dólares. Mas muito pouca, se considerado o nível que nossa inflação atingiu. O que nos salvou da dolarização foi a correção monetária, um truque para conviver com a inflação. Um paliativo, que nos foi permitindo conviver com a doença, sem, contudo, curá-la; na verdade, contribuía para perpetuá-la. A correção monetária consiste em aplicar, de maneira automática e prevista em contratos, formais ou não, a inflação medida por índices de preços no reajuste dos próprios preços e valores em geral da economia. Assim, a elevação dos preços era captada pelo índice de inflação e, no momento seguinte, esse índice era usado para corrigir os preços, salários, aluguéis etc. Esse aumento seria, claro captado na próxima coleta de preços para se calcular o índice de inflação. Assim, a inflação se perpetuava, se transmitindo de um período a outro através do índice de preços. Por outro lado, essa sistemática protegia, ainda que parcialmente, o poder de compra dos rendimentos em geral. Esse processo de manutenção da inflação, de sua transmissão ao longo do tempo, ganhou o nome de inércia inflacionária (ou persistência, termo mais usado atualmente).
O diagnostico de que a inflação brasileira era predominantemente inercial levou, no início dos anos 1980, a duas propostas de tratamento: a moeda indexada e o congelamento de preços. A moeda indexada foi descartada nas primeiras tentativas, por causa do receio de que a estratégia acabasse gerando uma hiperinflação “clássica”, com consequências sociais e políticas imprevisíveis. A nossa hiperinflação, a gente ia levando com a correção monetária. E venceu a ideia de se fazer um congelamento geral de preços e salários, adotado nos planos Cruzado (1986), Bresser (1987), Verão (1989), Collor I (1990) e Collor II (1991), todos fracassados. Quer dizer, de 1986 a 1991, tivemos quase um congelamento geral de preços e salários por ano, com exceção apenas de 1988! E a inflação voltava cada vez mais forte, como nos filmes de terror ou ação em que o monstro renasce ainda mais assustador e poderoso. Em 1994, foi retomada a ideia da moeda indexada e aplicada no Plano Real.
Além da distinção entre inflação e hiperinflação, apresento agora outra noção que ficou clara para mim na época do Real. A inércia inflacionária está intimamente ligada à indexação; como explicado, a indexação generalizada leva à transmissão da inflação de um período para o outro, perpetuando-a. Esse período pode ser um ano, um trimestre, um mês... Quanto mais alta a inflação, maior a necessidade de se reduzir o prazo entre os reajustes pela inflação passada. Os ajustes vão se tornando mais frequentes. Note que a inércia está associada ao grau de indexação dos preços e também ao período entre dois reajustes. Quanto maior esse período, maior a inércia. Se esse período é de um ano, a correção monetária vai trazer para o presente a inflação que ocorreu nos doze meses anteriores. Se a indexação for trimestral, só um trimestre de “memória inflacionária” será atualizado. Esse prazo pode cair para um mês. E para um dia! Mas, se a correção monetária é diária, a memória é de um dia apenas e, por maior que seja a taxa de inflação, a inflação de um dia será relativamente pequena. De modo que, com correção monetária diária disseminada na maior parte dos preços, a inércia praticamente desaparece. Assim, se, em processos mais “normais”, a indexação promove a inércia, num processo de indexação generalizada com ajustes diários, ao contrário, a inércia desaparece, de maneira que, quando os preços param de crescer, não há ajustes corretivos de preços a serem feitos: os preços relativos já estão alinhados. Os planos de congelamento tentaram resolver esse problema com as “tablitas”, que ajustavam preços e salários por uma média de meses anteriores, mas, como vimos, não deram certo. O “pulo do gato” do Real foi a percepção de que, como as pessoas corrigiam os preços pela inflação, se os preços fossem medidos em unidades de índice de preço, a inflação seria bem baixa - a verdadeira inflação, a normal, que ocorre em todas as economias. Ora, porque não transformar o índice de preços, que já era usado como unidade de conta, em uma moeda completa? As Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN) ou similares, conforme a época, como as Obrigações do Tesouro Nacional (OTN) e o Bônus do Tesouro Nacional (BTN), já eram usadas como uma unidade monetária em que se expressavam valores (no lugar de usar o dólar, por exemplo). A ideia do Plano Larida, proposto por André Lara Resende e Pérsio Arida no início dos anos 1980 foi posta em prática em 1994 com a Unidade Real de Valor, a URV, que, depois de quatro meses como unidade de conta, se transformou na nova moeda, o real, a partir de 1º de julho de 1994. Assim, o processo de passagem da moeda antiga (cruzeiro e, durante um período relativamente curto, cruzeiro real) foi como uma hiperinflação controlada – lembre-se, a hiperinflação é um processo de substituição de moeda. Enquanto uma hiperinflação clássica se dá de forma caótica e com graves consequências sociais e políticas, no caso do Plano Real a troca controlada feita por livre adesão à URV trouxe, ao contrário, efeitos sociais e políticos positivos.
Ao fim do evento, foram sorteados dois exemplares do meu livro "Guia de Análise da Economia Brasileira" (Ed. Fundamento), que dedica dezessete páginas ao Plano Real. Abaixo alguns links para o livro (só sugestões, claro).

terça-feira, 6 de junho de 2017

Palestra no curso de Introdução à Economia da UFJF



Na palestra que dei no curso de Introdução à Economia do Prof. Ângelo Cardoso Pereira, em 31/5, na Universidade Federal de Juiz de Fora - MG, destaquei o tema da reforma da previdência, central na importante questão macroeconômica hoje, no Brasil, que é a das contas do governo. Interessante que, havendo tempo para explicar e entender, os alunos compreendem a necessidade da reforma, embora eu note, por aí, bastante rejeição a ela. Também falei da conjuntura econômica em geral, com enfoque didático, com base no meu livro “Guia de análise da economia brasileira”. http://www.ciadoslivros.com.br/guia-de-analise-da-economia-brasileira-709925-p560412
http://livraria.folha.com.br/livros/economia/guia-analise-economia-brasileira-estevao-kopschitz-xavier-1334997.html
http://www.travessa.com.br/guia-de-analise-da-economia-brasileira/artigo/0908a1c4-24bc-4b3a-b301-14fb7a4dbe3c
https://editorafundamento.com.br/index.php/guia-de-analise-da-economia-brasileira.html
(só sugestões - procure também em outros lugares, pode ser que encontre mais barato).